James Joyce
O senhor James Duffy residia em Chapelizod porque queria viver o mais longe possível da cidade e porque achava os outros subúrbios de Dublin medíocres, modernos demais e pretensiosos. Morava numa casa antiga e sombria, de cuja janela avistava o alambique desativado e, mais adiante, o rio de pouca profundidade em cujas margens foi construída Dublin. Não havia quadros nas paredes altas de seu quarto sem forração de carpete. Ele próprio havia comprado cada peça do mobiliário: uma cabeceira de cama de ferro pintada de preto, um lavatório de ferro, quatro cadeiras de cana-da-índia, um cabideiro, um balde de metal para guardar carvão, um aparador e atiçadores para a lareira e uma escrivaninha quadrada, de tampo duplo. Uma estante com prateleiras de madeira branca tinha sido improvisada numa reentrância da parede. O leito estava arrumado com lençóis brancos e uma pequena colcha negra e vermelha cobria o pé da cama. Sobre o lavatório havia um pequeno espelho e durante o dia uma lamparina de copa branca era o único enfeite que se via no console sobre a lareira. Os livros na estante de madeira branca estavam organizados de baixo para cima, de acordo com o tamanho. Um volume com as obras completas de Wordsworth ficava no canto da prateleira mais baixa e um exemplar do Maynooth Catechism, dentro da capa de pano de um livro de anotações, ficava no canto oposto da prateleira mais alta. A escrivaninha estava sempre guarnecida de apetrechos para escrever. Dentro da escrivaninha era guardado o manuscrito de uma tradução de Michael Kramer, de Hauptmann, com as marcações de cena escritas em tinta vermelha, bem como um pequeno maço de papéis presos por um pregador de bronze. Nessas folhas, de vez em quando, era registrada uma frase e, num momento de humor, a chamada de um anúncio de pílulas para o fígado tinha sido colada na parte superior da primeira página. Quando se erguia o tampo da escrivaninha, um aroma suave exalava: aroma de lápis de cedro ou de goma arábica ou de alguma maçã um pouco passada ali esquecida.
O senhor Duffy detestava qualquer coisa que indicasse desordem física ou mental. Um médico medieval o classificaria como saturnino. Seu rosto, que encerrava a história completa de seus anos, era marrom como as ruas de Dublin. Em sua cabeça comprida e avantajada cresciam cabelos negros ressecados; um bigode castanho não chegava a lhe encobrir os lábios pouco sorridentes. As maçãs do rosto acentuavam seu aspecto severo; mas não havia severidade nos olhos, que, contemplando o mundo por baixo das sobrancelhas castanhas, davam a impressão de ser ele um homem sempre pronto a descobrir nos outros qualidades redentoras, ainda que freqüentemente se decepcionasse. Vivia a pequena distância de seu corpo, observando os próprios atos com olhares furtivos e duvidosos. Tinha um estranho hábito autobiográfico que o fazia, de vez em quando, redigir mentalmente uma curta sentença sobre si mesmo contendo o sujeito na terceira pessoa e o predicado no passado. Jamais dava esmola a pedintes e caminhava com passo firme, tendo sempre à mão uma bengala de madeira de lei.
Há muitos anos era caixa de um banco particular em Baggot Street. Toda manhã ia de bonde até a cidade. Ao meio-dia fazia uma refeição no Dan Burke’s: uma garrafa de cerveja e meia porção de biscoitos de araruta. Às quatro da tarde terminava o expediente. Jantava num pequeno restaurante em George’s Street, onde sentia-se a salvo da juventude dourada de Dublin e no qual o cardápio era simples e autêntico. À noite costumava sentar-se ao piano da senhoria ou caminhava pelos arredores da cidade. O gosto pela música de Mozart às vezes o levava à ópera ou a um concerto: as únicas extravagâncias a que se permitia.
Não tinha amigos nem conhecidos, nem igreja, nem credo. Vivia espiritualmente sem qualquer comunhão com terceiros; visitava os parentes por ocasião do Natal e acompanhava-os ao cemitério quando morriam. Incumbia-se dessas duas obrigações sociais por uma questão de dignidade mas não fazia nenhuma outra concessão às convenções que regem a vida em sociedade. Chegava às vezes a pensar que, em determinadas circunstâncias, roubaria o banco onde trabalhava, mas, como tais circunstâncias nunca se apresentavam, sua vida seguia sem tribulações: uma história sem aventuras.
Certa noite encontrou-se sentado ao lado de duas mulheres numa sala de concertos. A sala, silenciosa e quase vazia, era um triste prenúncio de fracasso. A senhora que estava a seu lado percorreu com o olhar uma ou duas vezes a sala deserta e disse:
- Que pena a casa estar tão vazia esta noite! É tão desagradável cantar para cadeiras vazias!
Ele interpretou a observação como um convite à conversa. Surpreendia-o o fato de ela estar tão à vontade. Enquanto conversavam ele se esforçou no sentido de gravar na memória o rosto da mulher. Quando foi informado de que a jovem sentada ao lado dela era sua filha, pensou que a mulher devia ser cerca de uma ano mais nova do que ele. Seu rosto, que deve ter sido belo, conservava uma expressão inteligente. Era oval, com traços bem marcados. Os olhos eram resolutos, e de um azul-escuro. A princípio fixavam a pessoa com um ar desafiador, mas titubeavam com um movimento que parecia um desmaio da pupila caindo dentro da íris, indicando, momentaneamente, um temperamento de grande sensibilidade. A pupila, entretanto, logo recompunha-se e o temperamento recém-revelado voltava a ser controlado pela prudência; a jaqueta de astracã, porém, modelando um busto um tanto volumoso, voltava a acentuar o tom de desafio.
O senhor Duffy reencontrou a mulher algumas semanas depois num concerto em Earlsfort Terrace e aproveitou os momentos em que a filha não estava prestando atenção para adquirir um pouco de intimidade. Referiu-se uma ou duas vezes ao marido mas com um tom de voz que não denotava uma advertência. Ela se chamava senhora Sinico. O bisavô do marido nascera em Leghorn. O marido era capitão da marinha mercante e fazia a linha entre Dublin e a Holanda; tinham apenas uma filha.
Ao deparar com ela pela terceira vez, tomou coragem e marcou um encontro. Ela compareceu. Foi o primeiro de uma série; viam-se sempre à noite e buscavam os locais mais sossegados para suas caminhadas. O senhor Duffy, entretanto, não era dado a procedimentos escusos e, constatando que eram obrigados a se encontrar às escondidas, forçou-a a convidá-lo a freqüentar sua casa. O Capitão Sinico até gostava das visitas dele, pois pensava que a mão da filha estava em jogo. Dispensara a esposa de sua galeria de prazeres com tamanha franqueza que sequer lhe passava pela cabeça que alguém pudesse por ela se interessar. Com o senhor Sinico sempre viajando e a filha fora de casa dando aulas de música, o senhor Duffy tinha muitas oportunidades para desfrutar da companhia da mulher. Nenhum dos dois tivera anteriormente uma aventura daquelas e não viam em seu relacionamento nada de mal. Aos poucos suas mentes se entrelaçaram. Ele lhe emprestava livros, expunha-lhe suas idéias, abria-lhe o intelecto. Ela era toda ouvidos.
Às vezes, em troca das teorias por ele expostas, ela revelava algum fato de sua vida particular. Com uma atenção quase maternal exortava-o a abrir-se; tornou-se na verdade sua confessora. Ele lhe contou que durante algum tempo freqüentara reuniões do Partido Socialista Irlandês, nas quais tinha se sentido uma figura estranha em meio a um grupo de operários circunspectos, reunidos num sótão mal-iluminado por uma lamparina a óleo. Quando o partido dividiu-se em três facções, cada qual com seu próprio líder e seu próprio sótão, ele deixou de comparecer às reuniões. Os debates dos trabalhadores, segundo ele, eram por demais medíocres; o interesse que apresentavam na questão dos salários era exagerado. A seu ver, eram realistas extremados que careciam de um rigor de pensamento fruto de um ócio ao qual jamais teriam acesso. Nenhuma revolução social, ele afirmava, abalaria Dublin nos próximos séculos.
Ela lhe perguntou por que não colocava suas idéias no papel. Para quê, ele retrucou, com um desdém um tanto estudado. Para competir com homens que fazem produção em massa de frases, homens incapazes de raciocinar em termos de causa e efeito durante sessenta minutos sequer? Para submeter-se à crítica de uma classe média obtusa que confia sua moralidade à polícia e as belas-artes a donos de galerias?
Iam com freqüência a um bangalô de propriedade dela nos arredores de Dublin; ali costumavam ficar a sós. Aos poucos, à medida que suas mentes se entrelaçavam, passaram a falar de assuntos menos genéricos. A companhia dela era como solo tépido para uma planta exótica. Muitas vezes ela deixava que a noite caísse sobre os dois, não acendendo a lamparina. A sala discreta, na penumbra, o isolamento dos dois e a música que ainda vibrava em seus ouvidos os unia. Essa união enaltecia-o, polia as arestas de seu temperamento, trazia emoção à sua vida mental. Às vezes, surpreendia-se ouvindo o som de sua própria voz. Ele achava que aos olhos dela ascenderia a um status angelical; e, à medida que se apegava à natureza ardente da amiga, ouvia uma voz estranha e impessoal, que reconhecia como sendo dele próprio, insistindo a respeito da incurável solidão da alma. Não podemos nos dar, dizia a voz: pertencemos a nós mesmos. Os encontros terminaram quando certa noite, demonstrando um ardor fora do comum, a senhora Sinico tomou-lhe a mão apaixonadamente e apertou-a contra o rosto.
O senhor Duffy ficou muito surpreso. A interpretação que a mulher dera às suas palavras decepcionou-o. Deixou de visitá-la durante uma semana; então escreveu-lhe convidando-a a um encontro. Como não queria que esse último encontro fosse perturbado por confidências, escolheu uma pequena confeitaria próxima ao portão do parque. Era um dia frio de outono mas, apesar do frio, vaguearam pelas trilhas do parque durante quase três horas. Concordaram em romper o relacionamento: todo e qualquer vínculo, ele dissera na ocasião, é um vínculo com o sofrimento. Quando saíram do parque, caminharam em silêncio em direção ao ponto do bonde; de repente, ela começou a tremer tão violentamente que Duffy, com receio de que ela tivesse mais uma crise, despediu-se às pressas e deixou-a ali. Alguns dias mais tarde ele recebeu um pacote contendo seus livros e partituras.
Quatro anos se passaram. O senhor Duffy voltara à vida pacata de sempre. Seu quarto continuava sendo um testemunho da ordem que reinava em sua mente. Algumas partituras novas tinham sido acrescentadas ao atril na sala do andar inferior e na estante havia agora duas obras de Nietzsche: Assim falou Zaratustra e A gaia ciência. Raramente escrevia nas folhas de papel que guardava em sua escrivaninha. Uma frase, escrita dois meses após o último encontro com a senhora Sinico, dizia: “Amor entre homem e homem é impossível porque não deve haver relacionamento sexual e amizade entre homem e mulher é impossível porque pressupõe relacionamento sexual”. Parou de ir a recitais com receio de encontrá-la. Perdeu o pai; o sócio minoritário do banco aposentou-se; continuava indo de bonde ao centro da cidade toda manhã e no final da tarde voltava para casa a pé, depois de jantar moderadamente em George’s Street e ler o jornal vespertino como sobremesa.
Certa noite, quando estava prestes a enfiar na boca uma garfada de carne cozida e repolho, sua mão deteve-se. Tinha os olhos fixos num parágrafo da edição vespertina, apoiada na garrafa d’água. Devolveu ao prato o pedaço de carne e leu a coluna atentamente. Em seguida bebeu um copo d’água, empurrou o prato para o lado, dobrou o jornal, apoiou-se nos cotovelos e releu a coluna inúmeras vezes. O repolho começou a soltar no prato uma gordura esbranquiçada. A garçonete veio perguntar-lhe se a comida não estava bem cozida. Ele disse que estava a contento e deu mais umas garfadas, com dificuldade. Em seguida pagou a conta e saiu.
Caminhou rapidamente em meio ao crepúsculo de novembro batendo com a bengala na calçada num ritmo marcado e com a ponta amarelada do jornal aparecendo no bolso lateral do sobretudo. Na viela sossegada que vai do portão do parque até Chapelizod, desacelerou o passo. A bengala batia na calçada com pancadas menos enfáticas e sua respiração ofegante, com um silvo, condensava-se no ar frio de inverno. Quando chegou em casa subiu direto para o quarto e, tirando o jornal do bolso, releu a coluna sob a luz fraca que entrava pela janela. Lia em silêncio, movendo os lábios como um padre ao ler as orações do breviário. Eis a coluna:
MULHER MORRE NA ESTAÇÃO DE SYDNEY
Um Caso Doloroso
Hoje no Hospital Municipal de Dublin o legista de plantão (na ausência do Dr. Leverett) fez a autópsia do corpo da senhora Emily Sinico, de quarenta e cinco anos de idade, morta ontem à noite na Estação de Sydney. A autópsia revelou que a mulher, ao tentar atravessar a via férrea, foi atirada ao chão pela locomotiva que partiu de Kingstown às vinte e duas horas, sofrendo traumatismos na cabeça e ferimentos do lado direito do corpo que lhe causaram a morte.
James Lennon, condutor da locomotiva, declarou que trabalha na estrada de ferro há quinze anos. Ao escutar o apito tocado pelo funcionário da estação, deu partida na máquina e alguns instantes depois freou bruscamente ao ouvir uma gritaria. O trem ia devagar.
P. Dunne, carregador, declarou que quando o trem estava prestes a partir, viu uma mulher tentando atravessar os trilhos. Correu em direção a ela e gritou mas, antes de alcançá-la, ela fora apanhada pelo pára-choque da locomotiva e atirada ao chão.
Membro do júri: “O senhor viu a mulher cair?”
Testemunha: “Vi”.
Em seu depoimento o Sargento Croly, da polícia civil, declarou que ao chegar na estação encontrou a mulher estirada na plataforma, aparentemente morta. Mandou o corpo ser transportado para o saguão de embarque para aguardar a chegada da ambulância.
O policial nº 57 confirmou o depoimento.
Dr. Halpin, cirurgião-assistente do Hospital Municipal de Dublin, constatou que a mulher tivera duas costelas fraturadas e sofrera sérias contusões no ombro direito. O lado direito da cabeça também fora atingido na queda. No entanto, os ferimentos não eram suficientemente graves para causar a morte de uma pessoa. Na opinião do médico, a morte tinha sido causada por parada cardíaca.
O senhor H.B. Patterson Finlay, em nome da estrada de ferro, expressou grande pesar pelo acidente. A companhia sempre tomou todas as precauções possíveis para evitar que pessoas atravessassem os trilhos fora das passarelas, colocando avisos em cada estação e utilizando portões com mola, de modelo patenteado, nas passagens de nível. A vítima tinha o costume de atravessar os trilhos tarde da noite, ao deslocar-se de uma plataforma à outra, e, considerando as circunstâncias do caso, ele não acreditava que a companhia tivesse qualquer responsabilidade.
Capitão Sinico, de Leoville, subúrbio da estação de Sydney e marido da vítima, também prestou depoimento. Declarou que a vítima era sua esposa. Não se encontrava em Dublin na hora do acidente; acabara de chegar de Rotterdam. Estavam casados há vinte e dois anos e viveram felizes até cerca de dois anos atrás, quando a esposa começou a apresentar um comportamento um tanto desregrado.
A senhorita Mary Sinico disse que ultimamente a mãe começara a sair à noite para comprar bebida alcoólica. Ela, a testemunha, havia inúmeras vezes tentado aconselhá-la e a induzira a afiliar-se à liga contra o alcoolismo. Só chegou em casa uma hora depois de o acidente ter ocorrido.
O júri pronunciou a sentença de acordo com o laudo médico e isentou Lennon de toda e qualquer responsabilidade.
O legista de plantão declarou que se tratava de um caso bastante trágico e apresentou suas condolências ao Capitão Sinico e à sua filha. Exortou a estrada de ferro a tomar medidas enérgicas para evitar que acidentes semelhantes àquele voltassem a ocorrer. Ninguém foi responsabilizado.
*
O senhor Duffy ergueu os olhos do jornal e olhou pela janela, contemplando a melancólica paisagem noturna. O rio corria calado ao longo do alambique desativado e de vez em quando uma luz aparecia numa casa em Lucan Road. Que fim! A narrativa da morte da mulher deixou-o revoltado, assim como deixou-o igualmente revoltado o fato de haver revelado a ela coisas que para ele eram sagradas. As frases gastas, as expressões vazias de condolência e as palavras cuidadosamente escolhidas por um repórter induzido a esconder os detalhes de uma morte banal e vulgar revolviam-lhe o estômago. Ela não tinha apenas aviltado a si mesma mas a ele também. Era capaz de visualizar a trilha esquálida de seu vício desprezível, malcheiroso. Sua alma gêmea! Pensou nas infelizes que encontrara trôpegas pela rua, carregando canecas e garrafas para serem enchidas pelo barman. Deus do céu, que fim! Evidentemente, não estava preparada para a vida, não tinha a mínima força de vontade; era presa fácil dos vícios: uma dessas ruínas sobre as quais tem sido edificada a civilização. Como pôde ela descer tanto! Será possível que ele tinha se enganado tanto a seu respeito? Lembrou-se do rompante que ela tivera naquela noite e interpretou a reação da mulher de um modo mais implacável do que nunca. Não tinha agora a menor dificuldade em aprovar as medidas que havia tomado.
Quando a luz se extinguiu e suas lembranças começaram a dissipar-se, ele teve a impressão de que a mão da mulher tocara a sua. O choque que a princípio lhe afetara o estômago agora lhe afetava os nervos. Vestiu às pressas o sobretudo, pôs o chapéu e saiu porta afora. O ar frio esperava-o na soleira e penetrou-lhe pelas mangas de seu casaco. Quando chegou ao bar em Chapelizod Bridge, entrou e pediu uma bebida forte.
O proprietário serviu-o obsequiosamente mas não puxou assunto. No bar havia uns cinco ou seis operários conversando sobre o valor das terras de um senhor em County Kildare. Bebericavam em seus canecões de cerveja e fumavam, cuspindo no assoalho e de vez em quando raspando com a ponta das botinas um pouco de pó de serragem para encobrir as cusparadas. O senhor Duffy sentou-se numa banqueta e ficou olhando para o grupo, sem enxergá-los nem ouvi-los. Logo depois eles foram embora e o senhor Duffy pediu mais um drinque. Levou um bom tempo para beber essa dose. O bar estava bastante quieto. O proprietário encontrava-se esparramado sobre o balcão lendo o Herald e bocejando. De quando em vez se ouvia um bonde sacolejando na rua deserta.
Sentado ali, revivendo mentalmente os momentos que passara ao lado da mulher e evocando, alternadamente, as duas imagens em que ora a concebia, o senhor Duffy deu-se conta de que ela estava morta, tinha deixado de existir, tinha se transformado numa lembrança. Começou a sentir-se angustiado. Perguntou a si mesmo se não poderia ter feito algo mais. Não podia ter proposto a ela uma farsa: não era possível viver com ela ostensivamente. Tinha agido da forma que considerava mais correta. Que culpa poderia ter? Agora que ela se fora ele percebeu a solidão em que ela vivia, sozinha naquela sala noite após noite. Sua vida seria, igualmente, marcada pela solidão, até que ele também morresse, fosse transformado numa lembrança – se é que alguém dele se lembraria.
Já passava das nove quando saiu do bar. A noite estava fria e soturna. Entrou no parque pelo portão principal e caminhou por baixo das árvores desfolhadas. Percorreu as trilhas desertas por onde juntos tinham caminhado quatro anos antes. Parecia que ela caminhava ao seu lado na escuridão. Às vezes tinha a impressão de ouvir a voz da mulher roçar-lhe o ouvido e de sentir a mão dela roçar a sua. Deteve-se para escutar melhor. Por que lhe negara a vida? Por que a condenara à morte? Sentia-se moralmente arrasado.
Ao chegar ao ponto mais elevado de Magazine Hill, parou e olhou rio abaixo em direção a Dublin, cujas luzes cintilavam vermelhas e hospitaleiras na noite fria. Olhou pela encosta da colina e, ao pé da ladeira, que ficava na sombra do muro do parque, viu figuras humanas deitadas. Aquelas cenas de amor furtivas e venais levaram-no ao desespero. Arrancou de sua própria vida a idéia de retidão; sentiu que tinha ficado de fora da festa da vida. Um ser humano talvez o tivesse amado e ele negara-lhe vida e felicidade: condenara essa pessoa à ignomínia, a uma morte vergonhosa. Sabia que as criaturas prostradas à sombra do muro estavam olhando para ele e desejavam que fosse embora. Ninguém o queria; estava fora da festa da vida. Desviou o olhar para o rio cinzento e reluzente, que se retorcia em direção a Dublin. Na margem oposta, avistou um trem de carga retorcendo-se ao sair da Estação de Kingsbridge, como um verme com a cabeça flamejante retorcendo-se na escuridão, obstinado, prosseguindo a duras penas. O trem saiu de seu campo de visão; mas ele ainda ouvia o ruído penoso da locomotiva repetindo as sílabas do nome da mulher.
Retornou pelo mesmo caminho que viera, com o ritmo da locomotiva martelando-lhe os ouvidos. Começou a duvidar do que lhe dizia a memória. Parou embaixo de uma árvore e esperou que o ritmo cessasse. Já não sentia a presença dela na escuridão, nem a sua voz roçando-lhe o ouvido. Permaneceu ali mais algum tempo escutando. Não ouvia nada: na noite reinava um silêncio total. Continuou escutando: silêncio total. Sentiu que estava só.
[1912]
Conto extraído de
JOYCE, James. Dublinenses. 2ª ed. São Paulo: Siciliano, 1994.
A Painful Case - James Joyce
Mr. James Duffy lived in Chapelizod because he wished to live as far as
possible from the city of which he was a citizen and because he found
all the other suburbs of Dublin mean, modern and pretentious. He lived
in an old sombre house and from his windows he could look into the
disused distillery or upwards along the shallow river on which Dublin is
built. The lofty walls of his uncarpeted room were free from pictures.
He had himself bought every article of furniture in the room: a black
iron bedstead, an iron washstand, four cane chairs, a clothes- rack, a
coal-scuttle, a fender and irons and a square table on which lay a
double desk. A bookcase had been made in an alcove by means of shelves
of white wood. The bed was clothed with white bedclothes and a black and
scarlet rug covered the foot. A little hand-mirror hung above the
washstand and during the day a white-shaded lamp stood as the sole
ornament of the mantelpiece. The books on the white wooden shelves were
arranged from below upwards according to bulk. A complete Wordsworth
stood at one end of the lowest shelf and a copy of the Maynooth
Catechism, sewn into the cloth cover of a notebook, stood at one end of
the top shelf. Writing materials were always on the desk. In the desk
lay a manuscript translation of Hauptmann's Michael Kramer, the stage
directions of which were written in purple ink, and a little sheaf of
papers held together by a brass pin. In these sheets a sentence was
inscribed from time to time and, in an ironical moment, the headline of
an advertisement for Bile Beans had been pasted on to the first sheet.
On lifting the lid of the desk a faint fragrance escaped -- the
fragrance of new cedarwood pencils or of a bottle of gum or of an
overripe apple which might have been left there and forgotten.
Mr.
Duffy abhorred anything which betokened physical or mental disorder. A
medival doctor would have called him saturnine. His face, which carried
the entire tale of his years, was of the brown tint of Dublin streets.
On his long and rather large head grew dry black hair and a tawny
moustache did not quite cover an unamiable mouth. His cheekbones also
gave his face a harsh character; but there was no harshness in the eyes
which, looking at the world from under their tawny eyebrows, gave the
impression of a man ever alert to greet a redeeming instinct in others
but often disappointed. He lived at a little distance from his body,
regarding his own acts with doubtful side-glasses. He had an odd
autobiographical habit which led him to compose in his mind from time to
time a short sentence about himself containing a subject in the third
person and a predicate in the past tense. He never gave alms to beggars
and walked firmly, carrying a stout hazel.
He had been for many
years cashier of a private bank in Baggot Street. Every morning he came
in from Chapelizod by tram. At midday he went to Dan Burke's and took
his lunch -- a bottle of lager beer and a small trayful of arrowroot
biscuits. At four o'clock he was set free. He dined in an eating-house
in George's Street where he felt himself safe from the society o
Dublin's gilded youth and where there was a certain plain honesty in the
bill of fare. His evenings were spent either before his landlady's
piano or roaming about the outskirts of the city. His liking for
Mozart's music brought him sometimes to an opera or a concert: these
were the only dissipations of his life.
He had neither companions
nor friends, church nor creed. He lived his spiritual life without any
communion with others, visiting his relatives at Christmas and escorting
them to the cemetery when they died. He performed these two social
duties for old dignity's sake but conceded nothing further to the
conventions which regulate the civic life. He allowed himself to think
that in certain circumstances he would rob his hank but, as these
circumstances never arose, his life rolled out evenly -- an
adventureless tale.
One evening he found himself sitting beside
two ladies in the Rotunda. The house, thinly peopled and silent, gave
distressing prophecy of failure. The lady who sat next him looked round
at the deserted house once or twice and then said:
"What a pity there is such a poor house tonight! It's so hard on people to have to sing to empty benches."
He
took the remark as an invitation to talk. He was surprised that she
seemed so little awkward. While they talked he tried to fix her
permanently in his memory. When he learned that the young girl beside
her was her daughter he judged her to be a year or so younger than
himself. Her face, which must have been handsome, had remained
intelligent. It was an oval face with strongly marked features. The eyes
were very dark blue and steady. Their gaze began with a defiant note
but was confused by what seemed a deliberate swoon of the pupil into the
iris, revealing for an instant a temperament of great sensibility. The
pupil reasserted itself quickly, this half- disclosed nature fell again
under the reign of prudence, and her astrakhan jacket, moulding a bosom
of a certain fullness, struck the note of defiance more definitely.
He
met her again a few weeks afterwards at a concert in Earlsfort Terrace
and seized the moments when her daughter's attention was diverted to
become intimate. She alluded once or twice to her husband but her tone
was not such as to make the allusion a warning. Her name was Mrs.
Sinico. Her husband's great-great-grandfather had come from Leghorn. Her
husband was captain of a mercantile boat plying between Dublin and
Holland; and they had one child.
Meeting her a third time by
accident he found courage to make an appointment. She came. This was the
first of many meetings; they met always in the evening and chose the
most quiet quarters for their walks together. Mr. Duffy, however, had a
distaste for underhand ways and, finding that they were compelled to
meet stealthily, he forced her to ask him to her house. Captain Sinico
encouraged his visits, thinking that his daughter's hand was in
question. He had dismissed his wife so sincerely from his gallery of
pleasures that he did not suspect that anyone else would take an
interest in her. As the husband was often away and the daughter out
giving music lessons Mr. Duffy had many opportunities of enjoying the
lady's society. Neither he nor she had had any such adventure before and
neither was conscious of any incongruity. Little by little he entangled
his thoughts with hers. He lent her books, provided her with ideas,
shared his intellectual life with her. She listened to all.
Sometimes
in return for his theories she gave out some fact of her own life. With
almost maternal solicitude she urged him to let his nature open to the
full: she became his confessor. He told her that for some time he had
assisted at the meetings of an Irish Socialist Party where he had felt
himself a unique figure amidst a score of sober workmen in a garret lit
by an inefficient oil-lamp. When the party had divided into three
sections, each under its own leader and in its own garret, he had
discontinued his attendances. The workmen's discussions, he said, were
too timorous; the interest they took in the question of wages was
inordinate. He felt that they were hard-featured realists and that they
resented an exactitude which was the produce of a leisure not within
their reach. No social revolution, he told her, would be likely to
strike Dublin for some centuries.
She asked him why did he not
write out his thoughts. For what, he asked her, with careful scorn. To
compete with phrasemongers, incapable of thinking consecutively for
sixty seconds? To submit himself to the criticisms of an obtuse middle
class which entrusted its morality to policemen and its fine arts to
impresarios?
He went often to her little cottage outside Dublin;
often they spent their evenings alone. Little by little, as their
thoughts entangled, they spoke of subjects less remote. Her
companionship was like a warm soil about an exotic. Many times she
allowed the dark to fall upon them, refraining from lighting the lamp.
The dark discreet room, their isolation, the music that still vibrated
in their ears united them. This union exalted him, wore away the rough
edges of his character, emotionalised his mental life. Sometimes he
caught himself listening to the sound of his own voice. He thought that
in her eyes he would ascend to an angelical stature; and, as he attached
the fervent nature of his companion more and more closely to him, he
heard the strange impersonal voice which he recognised as his own,
insisting on the soul's incurable loneliness. We cannot give ourselves,
it said: we are our own. The end of these discourses was that one night
during which she had shown every sign of unusual excitement, Mrs. Sinico
caught up his hand passionately and pressed it to her cheek.
Mr.
Duffy was very much surprised. Her interpretation of his words
disillusioned him. He did not visit her for a week, then he wrote to her
asking her to meet him. As he did not wish their last interview to be
troubled by the influence of their ruined confessional they meet in a
little cakeshop near the Parkgate. It was cold autumn weather but in
spite of the cold they wandered up and down the roads of the Park for
nearly three hours. They agreed to break off their intercourse: every
bond, he said, is a bond to sorrow. When they came out of the Park they
walked in silence towards the tram; but here she began to tremble so
violently that, fearing another collapse on her part, he bade her
good-bye quickly and left her. A few days later he received a parcel
containing his books and music.
Four years passed. Mr. Duffy
returned to his even way of life. His room still bore witness of the
orderliness of his mind. Some new pieces of music encumbered the
music-stand in the lower room and on his shelves stood two volumes by
Nietzsche: Thus Spake Zarathustra and The Gay Science. He wrote seldom
in the sheaf of papers which lay in his desk. One of his sentences,
written two months after his last interview with Mrs. Sinico, read: Love
between man and man is impossible because there must not be sexual
intercourse and friendship between man and woman is impossible because
there must be sexual intercourse. He kept away from concerts lest he
should meet her. His father died; the junior partner of the bank
retired. And still every morning he went into the city by tram and every
evening walked home from the city after having dined moderately in
George's Street and read the evening paper for dessert.
One
evening as he was about to put a morsel of corned beef and cabbage into
his mouth his hand stopped. His eyes fixed themselves on a paragraph in
the evening paper which he had propped against the water-carafe. He
replaced the morsel of food on his plate and read the paragraph
attentively. Then he drank a glass of water, pushed his plate to one
side, doubled the paper down before him between his elbows and read the
paragraph over and over again. The cabbage began to deposit a cold white
grease on his plate. The girl came over to him to ask was his dinner
not properly cooked. He said it was very good and ate a few mouthfuls of
it with difficulty. Then he paid his bill and went out.
He
walked along quickly through the November twilight, his stout hazel
stick striking the ground regularly, the fringe of the buff Mail peeping
out of a side-pocket of his tight reefer overcoat. On the lonely road
which leads from the Parkgate to Chapelizod he slackened his pace. His
stick struck the ground less emphatically and his breath, issuing
irregularly, almost with a sighing sound, condensed in the wintry air.
When he reached his house he went up at once to his bedroom and, taking
the paper from his pocket, read the paragraph again by the failing light
of the window. He read it not aloud, but moving his lips as a priest
does when he reads the prayers Secreto. This was the paragraph:
DEATH OF A LADY AT SYDNEY PARADE
A PAINFUL CASE
Today
at the City of Dublin Hospital the Deputy Coroner (in the absence of
Mr. Leverett) held an inquest on the body of Mrs. Emily Sinico, aged
forty-three years, who was killed at Sydney Parade Station yesterday
evening. The evidence showed that the deceased lady, while attempting to
cross the line, was knocked down by the engine of the ten o'clock slow
train from Kingstown, thereby sustaining injuries of the head and right
side which led to her death.
James Lennon, driver of the engine,
stated that he had been in the employment of the railway company for
fifteen years. On hearing the guard's whistle he set the train in motion
and a second or two afterwards brought it to rest in response to loud
cries. The train was going slowly.
P. Dunne, railway porter,
stated that as the train was about to start he observed a woman
attempting to cross the lines. He ran towards her and shouted, but,
before he could reach her, she was caught by the buffer of the engine
and fell to the ground.
A juror. "You saw the lady fall?"
Witness. "Yes."
Police
Sergeant Croly deposed that when he arrived he found the deceased lying
on the platform apparently dead. He had the body taken to the
waiting-room pending the arrival of the ambulance.
Constable 57 corroborated.
Dr.
Halpin, assistant house surgeon of the City of Dublin Hospital, stated
that the deceased had two lower ribs fractured and had sustained severe
contusions of the right shoulder. The right side of the head had been
injured in the fall. The injuries were not sufficient to have caused
death in a normal person. Death, in his opinion, had been probably due
to shock and sudden failure of the heart's action.
Mr. H. B.
Patterson Finlay, on behalf of the railway company, expressed his deep
regret at the accident. The company had always taken every precaution to
prevent people crossing the lines except by the bridges, both by
placing notices in every station and by the use of patent spring gates
at level crossings. The deceased had been in the habit of crossing the
lines late at night from platform to platform and, in view of certain
other circumstances of the case, he did not think the railway officials
were to blame.
Captain Sinico, of Leoville, Sydney Parade,
husband of the deceased, also gave evidence. He stated that the deceased
was his wife. He was not in Dublin at the time of the accident as he
had arrived only that morning from Rotterdam. They had been married for
twenty-two years and had lived happily until about two years ago when
his wife began to be rather intemperate in her habits.
Miss Mary
Sinico said that of late her mother had been in the habit of going out
at night to buy spirits. She, witness, had often tried to reason with
her mother and had induced her to join a League. She was not at home
until an hour after the accident. The jury returned a verdict in
accordance with the medical evidence and exonerated Lennon from all
blame.
The Deputy Coroner said it was a most painful case, and
expressed great sympathy with Captain Sinico and his daughter. He urged
on the railway company to take strong measures to prevent the
possibility of similar accidents in the future. No blame attached to
anyone.
Mr. Duffy raised his eyes from the paper and
gazed out of his window on the cheerless evening landscape. The river
lay quiet beside the empty distillery and from time to time a light
appeared in some house on the Lucan road. What an end! The whole
narrative of her death revolted him and it revolted him to think that he
had ever spoken to her of what he held sacred. The threadbare phrases,
the inane expressions of sympathy, the cautious words of a reporter won
over to conceal the details of a commonplace vulgar death attacked his
stomach. Not merely had she degraded herself; she had degraded him. He
saw the squalid tract of her vice, miserable and malodorous. His soul's
companion! He thought of the hobbling wretches whom he had seen carrying
cans and bottles to be filled by the barman. Just God, what an end!
Evidently she had been unfit to live, without any strength of purpose,
an easy prey to habits, one of the wrecks on which civilisation has been
reared. But that she could have sunk so low! Was it possible he had
deceived himself so utterly about her? He remembered her outburst of
that night and interpreted it in a harsher sense than he had ever done.
He had no difficulty now in approving of the course he had taken.
As
the light failed and his memory began to wander he thought her hand
touched his. The shock which had first attacked his stomach was now
attacking his nerves. He put on his overcoat and hat quickly and went
out. The cold air met him on the threshold; it crept into the sleeves of
his coat. When he came to the public-house at Chapelizod Bridge he went
in and ordered a hot punch.
The proprietor served him
obsequiously but did not venture to talk. There were five or six
workingmen in the shop discussing the value of a gentleman's estate in
County Kildare They drank at intervals from their huge pint tumblers and
smoked, spitting often on the floor and sometimes dragging the sawdust
over their spits with their heavy boots. Mr. Duffy sat on his stool and
gazed at them, without seeing or hearing them. After a while they went
out and he called for another punch. He sat a long time over it. The
shop was very quiet. The proprietor sprawled on the counter reading the
Herald and yawning. Now and again a tram was heard swishing along the
lonely road outside.
As he sat there, living over his life with
her and evoking alternately the two images in which he now conceived
her, he realised that she was dead, that she had ceased to exist, that
she had become a memory. He began to feel ill at ease. He asked himself
what else could he have done. He could not have carried on a comedy of
deception with her; he could not have lived with her openly. He had done
what seemed to him best. How was he to blame? Now that she was gone he
understood how lonely her life must have been, sitting night after night
alone in that room. His life would be lonely too until he, too, died,
ceased to exist, became a memory -- if anyone remembered him.
It
was after nine o'clock when he left the shop. The night was cold and
gloomy. He entered the Park by the first gate and walked along under the
gaunt trees. He walked through the bleak alleys where they had walked
four years before. She seemed to be near him in the darkness. At moments
he seemed to feel her voice touch his ear, her hand touch his. He stood
still to listen. Why had he withheld life from her? Why had he
sentenced her to death? He felt his moral nature falling to pieces.
When
he gained the crest of the Magazine Hill he halted and looked along the
river towards Dublin, the lights of which burned redly and hospitably
in the cold night. He looked down the slope and, at the base, in the
shadow of the wall of the Park, he saw some human figures lying. Those
venal and furtive loves filled him with despair. He gnawed the rectitude
of his life; he felt that he had been outcast from life's feast. One
human being had seemed to love him and he had denied her life and
happiness: he had sentenced her to ignominy, a death of shame. He knew
that the prostrate creatures down by the wall were watching him and
wished him gone. No one wanted him; he was outcast from life's feast. He
turned his eyes to the grey gleaming river, winding along towards
Dublin. Beyond the river he saw a goods train winding out of Kingsbridge
Station, like a worm with a fiery head winding through the darkness,
obstinately and laboriously. It passed slowly out of sight; but still he
heard in his ears the laborious drone of the engine reiterating the
syllables of her name.
He turned back the way he had come, the
rhythm of the engine pounding in his ears. He began to doubt the reality
of what memory told him. He halted under a tree and allowed the rhythm
to die away. He could not feel her near him in the darkness nor her
voice touch his ear. He waited for some minutes listening. He could hear
nothing: the night was perfectly silent. He listened again: perfectly
silent. He felt that he was alone.
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2 comentários:
Obrigado pela postagem, Sérgio.
Abraços.
Que coisa linda
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