quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Sobre importâncias - Manoel de Barros

Uma rã se achava importante
Porque o rio passava nas suas margens.
O rio não teria grande importância para a rã
Porque era o rio que estava ao pé dela.
Pois Pois.
Para um artista aquele ramo de luz sobre uma lata
desterrada no canto de uma rua, talvez para um
fotógrafo, aquele pingo de sol na lata seja mais
importante do que o esplendor do sol nos oceanos.
Pois Pois.
Em Roma, o que mais me chamou atenção foi um
prédio que ficava em frente das pombas.
O prédio era de estilo bizantino do século IX.
Colosso!
Mas eu achei as pombas mais importantes do que o
prédio.
Agora, hoje, eu vi um sabiá pousado na Cordilheira
dos Andes.
Achei o sabiá mais importante do que a Cordilheira
dos Andes.
O pessoal falou: seu olhar é distorcido.
Eu, por certo, não saberei medir a importância das
coisas: alguém sabe?
Eu só queria construir nadeiras para botar nas
minhas palavras.

                       Manoel de Barros, in Tratado geral das grandezas do ínfimo (2001).